O que é Qualidade Visual?
A percepção da imagem de um objeto pelo Sistema Visual Humano é uma atividade complexa que depende, inicialmente, da formação da imagem pelo olho com o processamento óptico e posteriormente, da condução desta informação para o sistema nervoso central, onde será realizado o processamento neural para interpretação da imagem pelo cérebro.
Processamento da Imagem pelo Sistema Ocular e pelo Sistema Nervoso Central
O olho é um sistema óptico similar a uma máquina fotográfica, capaz de transformar a luz emitida por um objeto em uma imagem focalizada na retina. Esta imagem é um sinal luminoso que será conduzido pelo nervo óptico até a área do processamento visual cerebral, chamada Área 17 de Broadmann, no córtex occipital, localizada na área posterior do cérebro.
Como Enxergamos os Objetos?
Para entendermos como o sistema óptico forma a imagem de um objeto, utilizemos o indicador da imagem do ponto na retina chamado “Função de Espalhamento do Ponto”, que na língua inglesa é o “Point Spread Function” ou PSF.
O PSF, portanto, é a imagem formada na retina de um ponto de luz emitido por um objeto.
Se o sistema óptico ocular fosse perfeito, o PSF da imagem seria exatamente igual ao objeto.
No entanto, não existe sistema ocular perfeito! A imagem de um ponto não pode ser um ponto!
E por quê?
Porque, a luz, ao atravessar o olho, é influenciada por três fenômenos físicos que modificam a imagem formada na retina: difração, aberrações e scatter (dispersão).
Falando sobre a Difração…
A Difração é o fenômeno físico da mudança da trajetória da luz ao atravessar a borda de um obstáculo, que no olho, corresponde à pupila.
Enquanto os raios centrais percorrem sua trajetória normal e são focalizados como um ponto central, os raios que foram desviados na borda da pupila são focalizados na área periférica, formando um pequeno disco rodeado por anéis atenuados, chamado Disco de Airy.
Falando sobre Aberrações…
Quando os raios de luz atravessam a córnea e o cristalino, que são as lentes naturais do olho, sofrem o fenômeno da refração.
Estes raios mudam sua trajetória, formando uma superfície de frente de ondas complexa, que modifica a imagem do ponto formado na retina.
Quanto maior o tamanho da pupila, maiores são as aberrações oculares.
As aberrações oculares estão descritas, em detalhes, na Sessão Doenças – Erros Refrativos – Aberrações Oculares.
É por isso que a imagem de um ponto jamais é um ponto! Quanto menor o tamanho da pupila, maior será o fenômeno da difração.
Falando sobre o Scatter…
O termo Scatter, da língua inglesa, é o fenômeno da dispersão da luz, que sofre uma reflexão difusa ao atravessar estruturas opacas ou com microirregularidades na superfície.
No olho, a dispersão da luz acontece, principalmente, quando o cristalino está opaco com catarata ou quando a córnea apresenta opacidades, com a perda da sua transparência.
Quanto maior a opacidade, maior o Scatter da luz!
E Como Analisamos a Qualidade Visual ?
A qualidade visual do sistema ocular pode, atualmente, ser avaliada de forma direta, com o Analisador de Qualidade Visual HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) e de forma indireta, com os exames de Aberrometria Ocular.
Estes exames avaliam apenas a parte óptica da qualidade visual, ou seja, a formação da imagem até a retina.
Para mensurar a Qualidade Neuro-Visual, ou seja, a qualidade visual da imagem processada pelo Sistema Nervoso Central, utilizamos Testes de Qualidade Visual, descritos adiante.
Análise Direta da Qualidade Visual Ocular
Exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS)
O exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) avalia a qualidade visual com a medida direta do PSF correspondente do ponto-imagem na retina.
Este equipamento utiliza o método de dupla passagem da luz no sistema óptico, obtendo a imagem do PSF na retina, após a luz ter atravessado pelo olho e ter sido influenciada pelos fenômenos da difração e especialmente das aberrações e do scatter.
Como o exame analisa a luz que atravessa a área delimitada nos 4 milímetros da pupila, para este diâmetro, o fenômeno da difração tem pouca significância clínica.
Ao analisarmos a qualidade do PSF, quanto mais puntual, compacto, brilhante, claro e localizado for o PSF, melhor será a qualidade da imagem formada, que será mais parecida com o ponto do objeto real.
No entanto, quando o PSF é irregular, mais espalhado e com menor intensidade de luz na região central, isso significa que a imagem formada não tem boa qualidade, pois o olho possui aberrações e/ou scatter que modificaram a trajetória da luz até a retina.
Para quantificar o espalhamento da luz do PSF devido ao fenômeno do Scatter, foi elaborado o Índice de Dispersão Objetivo – Objective Scatter Index – OSI, obtido pela divisão do raio da intensidade da luz no centro do PSF (sem scatter) e o raio da intensidade da luz na periferia do PSF (com scatter).
Sendo assim, quanto menor o OSI, melhor a qualidade da imagem.
Além da medida do PSF e do OSI do sistema óptico total, o exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) também avalia a dinâmica do filme lacrimal, obtendo a imagem do PSF influenciada pela lágrima, a cada 0,5 segundos, até a conclusão de 20 segundos de captura.
Desta forma, o sistema registra 40 imagens, mostrando a evolução da qualidade óptica relacionada ao filme lacrimal durante os 20 segundos medidos, que será de boa qualidade para filmes lacrimais com estabilidade e de qualidade ruim para olhos secos com instabilidade da lágrima.
Com o estudo do gráfico evolutivo dos valores do OSI do filme lacrimal, foi observado que podem existir três tipos de padrões de filme lacrimal e padrões mistos entre eles:
– Padrão Plateau – (Padrão Platô)
Padrão ideal, reflete filme lacrimal estável durante os 20 segundos – sinal verde para cirurgias oculares com finalidade refrativa.
– Padrão SeeSaw (Padrão em Balanço)
Reflete filme lacrimal instável, que melhora com o piscar, mas depois perde novamente a estabilidade – sinal amarelo, precisa de tratamento para olho seco e estabilização da lágrima para cirurgias oculares com finalidade refrativa.
– Padrão Ladder (Padrão em Escada)
Pior padrão, reflete filme bem instável que não melhora ao piscar e aumenta a instabilidade com o tempo – sinal vermelho para cirurgias oculares com finalidade refrativa.
O exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) também avalia o processo da acomodação ocular, com a medida da profundidade de foco para visão de longe e para a visão de perto.
Importância Clínica da Avaliação da Qualidade Visual
Com a avaliação da qualidade visual do exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS), é possível que o paciente e o seu médico vejam como a imagem está sendo formada na retina e quais fenômenos ópticos presentes no olho estão interferindo neste processo.
Estas medidas objetivas da qualidade visual têm se tornado um guia muito útil para o diagnóstico da qualidade visual do sistema óptico, para tratamento e acompanhamento do olho seco, bem como para indicação de Cirurgias de Catarata e Cirurgias Refrativas.
Diagnóstico da Qualidade Visual
No exemplo seguinte, o exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) desta paciente de 20 anos mostra boa qualidade da imagem, refletindo um meio óptico transparente, com muito pouco scatter e capaz de alcançar uma excelente acuidade visual prevista pelo equipamento; boa estabilidade da lágrima com padrão em platô (Plateau Pattern) e bom intervalo acomodativo de 2,5 dioptrias (D).
No próximo exemplo, o exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) desta paciente de 36 anos mostra boa qualidade visual e boa qualidade da lágrima, mas com diminuição da capacidade de focalizar para visão de perto, evidenciando um intervalo acomodativo de 0,75 D.
Diagnóstico e Tratamento do Olho Seco
No próximo exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) podemos observar que o olho apresenta boa qualidade visual, no entanto, com olho seco devido à instabilidade da lágrima.
Após o tratamento do olho seco com colírio lubrificante, houve melhora significativa da lágrima.
Indicações de Cirurgia de Catarata e Cirurgia Refrativa
Do ponto de vista prático, o valor do Índice de Dispersão Objetivo – OSI, obtido no exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) pode, atualmente, auxiliar o médico nas indicações de Cirurgias Refrativas e de Catarata, sendo correlacionado sempre à avaliação clínica (idade e avaliação biomicroscópica), da seguinte forma:
Se o OSI estiver baixo, significa que o olho tem boa qualidade visual, com pouca dispersão da luz e sem opacidades dos meios, por isso não há necessidade de Cirurgia de Catarata.
Se o paciente quiser enxergar bem sem os óculos e a lágrima estiver com boa estabilidade (OSI da lágrima baixo), poderá fazer Cirurgia Refrativa.
No entanto, se o olho estiver seco (OSI da lágrima alto), precisa fazer o tratamento do olho seco e estabilizar a lágrima para estar apto à Cirurgia Refrativa.
Se o OSI estiver alto, significa que o olho apresenta dispersão da luz, com aumento do índice de scatter ocular. Como a maior causa do scatter ocular é a catarata, na ausência de outras fontes de scatter de pacientes que já estejam na faixa etária da Síndrome da Lente Disfuncional, deve ser indicada a Cirurgia de Catarata para restauração da qualidade visual.
Se o paciente quiser ficar livre dos óculos após a Cirurgia de Catarata e a lágrima estiver com boa estabilidade (OSI da lágrima baixo), é ótimo candidato, do ponto de vista óptico, para o implante da lente multifocal.
No entanto, se o olho estiver seco (OSI da lágrima alto), o efeito óptico da instabilidade do filme lacrimal na imagem retiniana não permitirá a boa acuidade visual pós-operatória com o implante da lente multifocal.
É preciso, primeiramente, estabilizar o filme lacrimal com o tratamento do olho seco, para que o paciente possa ter o benefício de enxergar com boa qualidade visual, após o implante da lente multifocal.
Melhora do Scatter após a Cirurgia de Catarata
No caso seguinte, este paciente de 70 anos com catarata inicial e similar em ambos os olhos, apresentou exame HD Analyzer – Optical Quality Analysis System (OQAS) com scatter aumentado no olho direito e pouco scatter no olho esquerdo, tendo sido indicada a Cirurgia de Catarata apenas no olho direito.
Após a Cirurgia de Catarata do olho direito, o scatter do olho direito reduziu e ficou similar ao do olho esquerdo, que não foi operado.
Análise Indireta da Qualidade Visual Ocular
Exame de Aberrometria Ocular
Com as medidas das aberrações oculares obtidas no exame de Aberrometria Ocular, é possível aplicar fórmulas matemáticas complexas denominadas Transformação de Fourier e calcular indiretamente o PSF correspondente do ponto-imagem na retina relacionado com estas aberrações.
Deste modo, o exame de Aberrometria pode avaliar a qualidade visual com a estimativa do PSF resultante da influência das aberrações.
Como o exame de aberrometria não mede o fenômeno do scatter e não mede diretamente o PSF, podemos dizer que o exame realiza uma avaliação parcial e indireta da qualidade visual.
No exame de Aberrometria seguinte podemos verificar o resultado de uma paciente com boa qualidade visual, representada pelo Mapa das Aberrações Oculares com poucas aberrações de alta ordem e pelo Mapa do PSF com simulação do PSF pontual na retina.
No próximo exame de Aberrometria, a qualidade visual está alterada pelo aumento das aberrações de alta ordem no Mapa das Aberrações Oculares e PSF irregular e espalhado no Mapa do PSF.
Análise da Qualidade Neuro-Visual
Testes de Qualidade Visual
Os testes de qualidade visual têm, como objetivo, avaliar a acuidade visual do Sistema Neuro-Visual.
Um objeto, para ser visível ao olho humano, depende do seu tamanho e do contraste entre ele e o fundo sobre o qual se encontra.
O olho humano pode observar um objeto escuro em um fundo claro ou um objeto claro em um fundo escuro.
Testes de Acuidade Visual de um Objeto Escuro em Fundo Claro
Se um objeto escuro se encontra em um fundo claro, o fator limitante para a detecção deste objeto é o tamanho ou a distância em que ele se encontra do olho humano, ou seja, o objeto tem que apresentar um dimensão mínima para ser percebido.
As tabelas de acuidade visual de alto contraste avaliam a acuidade visual de longe para objetos escuros em fundo claro, ou seja, letras compostas por linhas negras sobre um fundo branco, com contraste de 100%.
Atualmente existem inúmeras tabelas de acuidade visual de alto contraste, mas o primeiro cientista que padronizou a medida da acuidade visual foi o holandês Herman Snellen, após publicar, em 1862, a Tabela de Snellen. Desde então, esta tabela é a mais utilizada no exame oftalmológico de rotina.
Uma tabela de alto contraste que é muito utilizada para finalidade de pesquisa científica é a Tabela ETDRS.
Para medida da visão de perto, a tabela de acuidade visual mais utilizada é da Tabela de Jaeger.
Os resultados do teste da acuidade visual de alto contraste são bem correlacionáveis com alterações da qualidade visual, em um grande número de alterações oculares.
No entanto, muitas doenças podem alterar outros aspectos da percepção visual sem afetar, inicialmente, a acuidade visual de alto contraste.
A catarata é um destes exemplos, que altera a qualidade visual devido ao fenômeno do scatter, causando ofuscamento noturno, bem antes de modificar a acuidade visual de alto contraste.
Testes de Acuidade Visual de um Objeto Claro em Fundo Escuro
Se um objeto claro se encontra em um fundo escuro, o fator limitante para a detecção deste objeto não mais é o tamanho ou a distância em que ele se encontra do olho humano, mais sim, a diferença de contraste devido às diferentes iluminações entre o objeto claro e o fundo escuro.
A capacidade do sistema visual de perceber estas variações de contraste caracteriza a sensibilidade ao contraste.
Para avaliar a função de sensibilidade ao contraste foram desenvolvidos testes mais complexos de medida da acuidade visual denominados Testes de Sensibilidade ao Contraste.
Estes testes envolvem variações de luminosidade entre objetos que não apresentam bordas nítidas de separação, podendo utilizar letras ou grades senoidais de diferentes contrastes.
A Tabela ETDRS é um dos testes de medida de acuidade visual que contém telas com letras com diferentes níveis de contraste, para a medida da acuidade visual de baixo contraste.
Os Testes de Sensibilidade ao Contraste utilizam grades senoidais, que podem estar dispostas apenas no sentido vertical, como no teste CSV-100 ou nos sentidos vertical e oblíquo, como no teste Funcional Acuity Contrast Test – FACT.
Atualmente, temos disponíveis analisadores de função visual que avaliam a sensibilidade ao contraste para medidas correlacionáveis com a visão diurna e noturna, como o Functional Vision Analyzer.
Além das medidas da sensibilidade ao contraste nas condições padrões de visão diurna e noturna, muitas pesquisas científicas avaliam o comportamento da qualidade visual em condições de ofuscamento da luz (glare).
Os testes de ofuscamento (glare) são importantes indicadores de scatter ocular. Atualmente é possível avaliar o ofuscamento com testes específicos como com o BAT – Brightness Acuity Test ou com testes multifuncionais como o C-Quant. Um novo teste, o EpiGlare foi elaborado para ser acoplado ao aparelho do greens, tendo a vantagem de ser portátil e prático.
Alguns Testes de Sensibilidade ao Contraste e alguns analisadores de qualidade visual como o Visual Function Analyzer podem ser realizados também com a fonte luminosa para testar como o ofuscamento está influenciando a qualidade visual.