O que é Olho Seco?

A Síndrome do Olho Seco ou Ceratoconjuntivite Seca (Keratoconjuntivitis Sicca – KCS) é uma Síndrome da Disfunção Lacrimal de múltiplas causas, caracterizada pelo aumento da evaporação ou pela diminuição da produção das lágrimas, resultando na lubrificação inadequada do olho.

O distúrbio de Olho Seco ocasional, que pode ser facilmente controlado, é diferente da doença do Olho Seco crônica ou Ceratoconjuntivite Seca, na qual há uma conseqüente disfunção irritativa e inflamatória, que pode levar à destruição progressiva das células da superfície ocular.

Como Atua a Unidade Funcional da Lágrima?

A Unidade Funcional da Lágrima

Produção das Camadas da Lágrima

A lágrima é uma mistura das secreções produzidas pelas glândulas localizadas nas pálpebras e é liberada através do mecanismo do piscar, coordenado pelo Sistema Nervoso Central.
Na definição mais moderna, a lágrima possui 2 camadas: a camada muco-aquosa e a camada lipídica gordurosa.

1. Produção da Camada Muco-Aquosa da Lágrima

1.1. Glândula Lacrimal – Água
A glândula lacrimal principal produz 95% da camada aquosa da lágrima de forma reflexa (por estímulo) e as glândulas lacrimais acessórias de Krause e Wolfring secretam a camada aquosa de forma basal (em repouso).
A camada aquosa possui substâncias com a função de nutrição e proteção da córnea contra lesões e infecções.

1.2. Células Caliciformes – Mucina
As células caliciformes da conjuntiva produzem a mucina, que é um muco que tem a função de aderir as demais camadas da lágrima às células epiteliais da córnea.

2. Produção da Camada Lipídica da Lágrima
As glândulas de Meibomius secretam a camada lipídica, com gorduras que lubrificam a superfície ocular e estabilizam a viscosidade da lágrima, protegendo-a da evaporação, além de manterem o filme lacrimal uniforme para a adequada passagem da luz na córnea.

 

Dinâmica do Piscar da Unidade Funcional da Lágrima

O Mecanismo do Piscar das pálpebras é geralmente um movimento involuntário, controlado pelo Sistema Nervoso Central.
O comando do Piscar, enviado pelo Sistema Nervoso Central através do VII nervo craniano (nervo motor) para as pálpebras, proporciona o fechamento da musculatura das pálpebras, o que estimula a liberação da camada aquosa da lágrima pelas glândulas lacrimais, da camada de mucina pelas células caliciformes da conjuntiva e da camada lipídica pelas glândulas de Meibomius.
Este filme lacrimal normal é uma película protetora estável que é direcionada da região lateral para a região medial da superfície ocular, é sugada pelo vácuo das vias lacrimais, atravessando os pontos lacrimais superiores e inferiores, os canalículos lacrimais e o ducto lacrimal, sendo escoada para o nariz e garganta.
Na fisiologia normal, geralmente após o período superior a 10 segundos, a lágrima evapora e deixa expostas as células epiteliais e as terminações nervosas do V Nervo (nervo sensitivo), o que gera o estímulo reflexo para um novo piscar, para um novo ciclo de lágrimas.
Em condições normais, portanto, o ritmo do piscar é, em torno de 20 vezes por minuto.


 

Quais as Causas do Olho Seco – Síndrome da Disfunção Lacrimal?

O Olho Seco pode ocorrer devido a 2 situações relacionadas à Síndrome da Disfunção Lacrimal: pelo aumento da evaporação da lágrima ou pela diminuição da produção da lágrima.

 

1. Olho Seco Evaporativo
O Olho Seco por aumento da evaporação da lágrima pode ser causado por fatores instrínsecos, inerentes à Unidade Funcional da Lágrima ou por fatores extrínsecos, externos à essa Unidade.

1.1. Causas Intrínsecas

1.1.1. Disfunção das Glândulas de Meibomius (DGM)/Blefarite
A maior causa do Olho Seco Evaporativo é, sem dúvida, a Disfunção das Glândulas de Meibomius, que geralmente está associada à Blefarite, descritas em detalhes na Sessão Doenças Blefarite.
Na Disfunção da Glândulas de Meibomius, geralmente ocorre processo um obstrutivo da glândula com diminuição da liberação de gordura para a lágrima, o que causa aumento da evaporação da camada de água da lágrima.

 

A gordura liberada também está modificada na sua qualidade pela ação de enzimas bacterianas, com secreção mais espessa e com ácidos graxos livres, o que também causa aumento da evaporação da lágrima e inflamação da margem das pálpebras – blefarite.

1.1.2. Modificações do Fechamento Palpebral
As diversas situações que modificam a dinâmica do piscar assim como a congruência pálpebra-globo ocular podem causar a alteração do filme lacrimal com aumento da evaporação da lágrima.
Nas alterações palpebrais relacionadas à idade ocorre a flacidez do tecido palpebral com a eversão das pálpebras – ectrópio ou inversão das pálpebras – entrópio.

Nas alterações com o aumento do globo ocular, como na proptose da alta miopia ou na Oftalmopatia de Graves no hipertireoidismo, há retração palpebral, com maior exposição da córnea e aumento da evaporação da lágrima.
Na Síndrome das Pálpebras Frouxas – Floppy Eyelid Syndrome, a frouxidão palpebral altera o mecanismo fisiológico do piscar, causando olho seco.

Alterações neurológicas como as decorrentes da doença de Parkinson, que causem alteração da invervação e função das pálpebras, assim como as alterações do piscar nos pós-operatórios das cirurgias das pálpebras (blefaroplastias) também são causa do olho seco evaporativo.

1.1.3. Diminuição do Piscar
A diminuição do rimo do piscar é muito comum quando existem esforços visuais concentrados, como em leituras prolongadas, trabalhos com microscópios e na frente das telas dos computadores, tablets e smartphones gerando a Síndrome Visual do Computador com olho seco.

1.1.4. Ação da Droga Isotretinoína – Roacutan
A substância isotretinoína age diretamente nas glândulas sebáceas reduzindo sua dimensão e produção de gordura, sendo excelente para o tratamento de alterações dermatológicas do acne vulgaris grave. No entanto, sua ação leva à atrofia reversível das glândulas de Meibomius e olho seco.

1.2. Causas Extrínsecas

1.2.1. Conjuntivite Alérgica
As doenças crônicas da superfície ocular, como a conjuntivite alérgica, causam instabilidade no filme lacrimal e olho seco.

1.2.2. Uso de Lentes de Contato
O uso crônico das lentes de contato causa alteração do filme lacrimal e olho seco em, aproximadamente, 50% dos usuários.

1.2.3. Medicações Tópicas e Conservantes
Vários componentes das formulações de colírios podem induzir uma resposta tóxica na superfície ocular, especialmente os conservantes com cloreto de benzalcônio que causam lesão das células da superfície ocular e ceratite.
Os conservantes dos colírios antiglaucomatosos também são fonte importante de toxicidade.
O uso crônico de colírio anestésico reduz a secreção da glândula lacrimal e diminui o ritmo do piscar, podendo levar à ceratite neurotrófica e perfuração corneana.

 

1.2.4. Fatores Ambientais
Os fatores ambientais como a baixa umidade do ar e alta temperatura dos climas secos, velocidade dos ventos, poluição ou contaminação ambiental, ar condicionado, ventiladores, podem aumentar a evaporação da lágrima.

1.2.5. Fatores Hormonais
Visto que as mulheres apresentam mais olho seco do que os homens, várias pesquisas evidenciam que baixos níveis de andrógenos e altos níveis de estrógeno, como na terapia de resposição hormonal na menopausa são fatores de risco para olho seco.

1.2.6. Medicações Sistêmicas
Anti-histamínicos, betabloqueadores, antiespasmódicos, diuréticos e alguns psicotrópicos podem ser a causa do Olho Seco em muitos pacientes.

1.2.7. Fatores Nutricionais
A deficiência de Vitamina A causa olho seco e dificuldade visual principalmente à noite, sendo conhecida como cegueira noturna. Como a vitamina A é essencial para o desenvolvimento das células caliciformes na conjuntiva e da mucina, a sua deficiência causa a queratinização da conjuntiva (Manchas de Bitot) e da córnea, com a instabilidade do filme lacrimal e olho seco evaporativo. Alguns casos também podem apresentar lesão na glândula lacrimal com diminuição da produção de lágrima.

As deficiências de vitaminas C e B12 em pacientes com desnutrição também são causa de olho seco.

 

2. Olho Seco por Deficiência da Produção da Lágrima Aquosa
O Olho Seco por diminuição da produção da lágrima, definido como Olho Seco por Deficiência Aquosa, pode ser causado por alteração auto-imune da Síndrome de Sjogren como também por outras causas não-imunológicas.

2.1. Alteração Imunológica – Síndrome de Sjogren
A Síndrome de Sjogren é uma doença auto-imune que gera a inflamação da glândula lacrimal pelas células T da defesa (auto-anticorpos), que destroem as células da glândula lacrimal causando a diminuição da produção da lágrima.

2.1.1. Síndrome de Sjogren Primária
Na Síndrome de Sjogren primária, as glândulas lacrimais e as glândulas salivares são atingidas pelos auto-anticorpos, gerando olho seco e boca seca.
O diagnóstico da Síndrome de Sjogren primária ocorre na presença de olho seco com sintomas e sinais de ceratite e/ou alteração da produção de lágrimas, sintomas de boca seca, presença dos auto-anticorpos (anti-RO ou anti-LA), evidência de aumento das glândulas parótidas e da redução da secreção salivar com biópsia da glândula salivar evidenciando foco inflamatório.

2.1.2. Síndrome de Sjogren Secundária
Na Síndrome de Sjogren secundária, além do acometimento das glândulas lacrimais e salivares, há também a evidência de doença autoimune do tecido conjuntivo sistêmica como: a Artrite Reumatóide, o Lúpus Eritematoso Sistêmico, a Poliarterite Nodosa, a Granulomatose de Wegerner, a Esclerose Sistêmica, dentre outras mais raras.
Alguns pacientes com Síndrome de Sjogren possuem deficiência nutricional de ômega 3 e vitamina C, além de maior prevalência de Disfunção das Glândulas de Meibomius/ Blefarite.

2.2. Alterações Não-Imunológicas; Não-Sjogren
As causas de olho seco por baixa de produção de lágrimas que não estão associadas às alterações imunológicas (não-Sjogren) são por:

2.2.1. Deficiência da Glândula Lacrimal

2.2.1.1. Deficiência Primária da Glândula Lacrimal
A causa mais comum da deficiência primária da glândula lacrimal é a idade, que causa o Olho Seco Relacionado à Idade. As alterações celulares de atrofia e fibrose glandular causam diminuição da produção de lágrimas e olho seco.
Algumas doenças raras podem causar a deficiência da produção da lágrima como Alacrimia Congênita na qual a criança nasce sem a glândula lacrimal, a Disautonomia Familiar (Síndrome de Riley Day) em que há uma insensibilidade generalizada á dor e falta de reflexo de lacrimejamento, dentre outras.

2.2.1.2. Deficiência Secundária da Glândula Lacrimal
A glândula lacrimal pode apresentar infiltração inflamatória em doenças como Sarcoidose, Linfoma, AIDS, Amiloidose, Hemocromatose e na Doença Enxerto-Hospedeiro após Transplante de Medula Óssea.

2.2.2. Obstrução do Ducto da Glândula Lacrimal
Os ductos que drenam a lágrima da glândula lacrimal podem sem obstruídos nas conjuntivites cicatriciais.
Dentre as causas mais comuns estão as doenças cicatriciais como Tracoma, Penfigóide, Eritema Multiforme da Síndrome de Stevens-Jhonson, queimaduras químicas ou térmicas e radioterapia.

2.2.3. Hiposecreção Reflexa
A diminuição do estímulo da sensação da superfície ocular pode causar o olho seco pela redução da secreção reflexa da glândula lacrimal e também por causar a redução da freqüência do piscar, levando ao aumento da evaporação da lágrima.

2.2.3.1. Redução do Reflexo Sensorial
As situações que mais causam a diminuição da sensibilidade da córnea do nervo trigêmio (V par) são o uso crônico das lentes de contato, a neuropatia do Diabetes Mellitus, a denervação causada pelo Herpes Zoster, a neuropatia associada à Cirurgia Refrativa especialmente o LASIK.

2.2.3.2. Redução do Reflexo Motor
As situações que causam lesão no nervo motor (VII par) também levam a hiposecreção lacrimal e ao fechamento palpebral incompleto como Paralisia Facial.
O uso de medicamentos sistêmicos como anti-histamínicos, betabloqueadores, antiespasmódicos, diuréticos, antidepressivos tricíclicos, inibidores da recaptação da serotonina e outros psicotrópicos podem causar também a hiposecreção reflexa com olho seco por diminuição da produção lacrimal.

Como o Olho Seco Causa Inflamação da Superfície Ocular?

Atualmente é bem conhecido o mecanismo do Círculo Vicioso Inflamatório do Olho Seco, no qual, independente do fator inicial que cause o Olho Seco – diminuição da produção da lágrima ou aumento da evaporação – os fatores seqüenciais são estimulados e se retroalimentam no círculo de auto-perpetuação da reação inflamatória.


 

Quando a camada gordurosa da glândula de Meibomius está diminuída no filme lacrimal, a água rapidamente evapora, deixando a lágrima com menor volume e com maior concentração de sais gerando uma lágrima hiperosmolar.
Por outro lado, quando há diminuição da camada aquosa pela glândula lacrimal, não há distribuição uniforme da camada gordurosa do filme lacrimal e a água rapidamente evapora, deixando a lágrima com menor volume e com maior concentração de sais, o que ocasiona também uma lágrima hiperosmolar.
Enquanto em condições normais, apenas 1/3 da água evapora do filme lacrimal, no olho seco, a taxa de evaporação aumenta, significativamente, para em torno de 75%.

A lágrima hiperosmolar, também conhecida como “lágrima tóxica”, estimula reação inflamatória química imediata nas células da superfície ocular da córnea, da conjuntiva e da margem palpebral, que também ficam expostas à fricção mecânica crônica do piscar.
A perda das células epiteliais deixa as terminações nervosas corneais expostas que, em um momento inicial, estimulam a secreção reflexa da glândula lacrimal produzindo mais lacrimejamento. No entanto, esta exposição crônica dos nervos sensitivos gera diminuição da sensibilidade da córnea e causa liberação de fatores inflamatórios para a glândula lacrimal que, com o tempo, diminui a produção de lágrimas, o que gera mais instabilidade do filme lacrimal, mais olho seco e mais inflamação.

Quais os Sintomas do Olho Seco?

Embora haja portadores de olho seco sem sintomas, a maioria apresenta como principais sintomas a sensações de ressecamento, de corpo estranho, de areia de peso e/ou de queimação. Os olhos tendem a apresentar hiperemia (vermelhidão), lacrimejamento, secreção ocular, prurido, fotofobia (sensibilidade à luz). Os olhos ficam grudados ao acordar e com embaçamento visual, o que pode causar impacto na qualidade de vida.

Como é o Diagnóstico do Olho Seco?

Os exames oftalmológicos realizados para o diagnóstico do Olho Seco – Síndrome da Disfunção Lacrimal estão descritos em detalhes na Sessão Exames – Avaliação do Olho Seco.

Como é o Tratamento do Olho Seco?

O tratamento do Olho Seco – Síndrome da Disfunção Lacrimal está descrito em detalhes na Sessão Cirurgias – Tratamento do Olho Seco.