Biometria Ocular

 A Biometria Ocular é o exame que mensura várias características anatômicas do olho que são necessárias para o cálculo do poder refrativo da lente intraocular, na Cirurgia de Catarata.

No estudo da Óptica, o olho tem três elementos refrativos: a córnea, o cristalino e o comprimento axial, responsáveis pela focalização dos raios de luz na retina.

No processo da focalização da luz na retina, a córnea realiza o fenômeno da refração, de acordo com sua curvatura, sendo responsável por 2/3 do poder de refração ocular, em torno de 42 dioptrias. O cristalino, por sua vez, é responsável pelo 1/3 restante, em torno de 18 dioptrias. Deste modo, o poder refrativo do olho normal é de 60 dioptrias.

O olho normal que focaliza a luz corretamente na retina é denominado de olho emétrope, sem defeitos de refração. Este olho possui curvaturas e tamanho adequados para que a luz seja convergida corretamente na retina, como descrito na Sessão Doenças Erros Refrativos – Miopia, Hipermetropia e Astigmatismo.

Quando o olho tem curvaturas aumentadas e/ou tamanho (comprimento axial) aumentado, este olho terá miopia. Quando o olho tem curvaturas diminuídas e/ou tamanho diminuído, este olho terá hipermetropia. Quando o olho apresentar diferenças de curvaturas nos seus meridianos, este olho terá astigmatismo.

Visto que a Cirurgia de Catarata irá remover o cristalino opacificado, se não for colocada uma nova lente para ocupar o poder refrativo do cristalino, o resultado da refração pós-operatória será de alta hipermetropia.

Esta situação ocorreu nos primórdios da Cirurgia de Catarata, quando ainda não tinha sido inventada a lente intraocular. O olho sem cristalino, denominado de afácico (a=sem; fácico = cristalino), precisava da prescrição de óculos para correção da alta hipermetropia pós-operatória.

Em 8 de fevereiro de 1950, Dr. Harold Ridley, brilhantemente descobriu que o implante de uma lente intraocular modificava a refração ocular após a Cirurgia de Catarata. Este grande marco na Oftalmologia Mundial foi o início para evoluções tecnológicas contínuas da lentes intraoculares para Cirurgia de Catarata.

Para que o resultado da emetropia pós-operatória fosse obtido, haveria necessidade de se estabelecer o poder dióptrico da lente intraocular, para cada olho, de acordo com as suas medidas individualizadas.

Deste modo, surgiram os Cálculos Biométricos, que serão descritos na Sessão Exames – Cirurgia de Catarata – Cálculo da Lente Intraocular.

A grande maioria das fórmulas biométricas precisam das medidas da curvatura da córnea, da profundidade da câmara anterior (que atualmente corresponde à posição efetiva da lente intraocular) e do tamanho do olho (comprimento axial), para os cálculos matemáticos do poder dióptrico da lente intraocular. Algumas formas modernas também precisam da medida do diâmetro horizontal da córnea (branco-à-branco) e da espessura do cristalino.

Além disso, com a evolução das fórmulas biométricas, foi observado que a distância entre a córnea e a superfície anterior da lente intraocular implantada, que é a posição efetiva da lente, depende de fatores não apenas oculares, mas também relacionados às características físicas do modelo da lente intraocular, dentre outros.

Como descrito na Sessão Exames – Cirurgia de Catarata – Cálculo da Lente Intraocular, cada fórmula biométrica atual possui uma medida, com valor inerente à lente intraocular, que corresponde ao componente da posição efetiva da lente da fórmula em questão. Como exemplo, a fórmula Hoffer Q utiliza a constante pACD, a fórmula Haigis, a constante a0, a fórmula Holladay, o S-factor, e a fórmula SRK-T, a constante A.

Os exames de Biometria Ocular são todos capazes de medir o comprimento axial do globo ocular. A depender do modelo do Biômetro, as demais estruturas podem ser mensuradas para o cálculo biométrico.

É importante ressaltar que as medidas biométricas são diferentes para olhos com cristalino (fácico), sem cristalino ou lente intraocular (afácico) e com lente intraocular (pseudofácico). Por isso, no exame de biometria ocular, existe a opção da medida para estes tipos de olhos, além das opções para olhos com óleo de silicone.

Tipos de Biometria Ocular

 Biometria Ultrassônica

Os primeiros equipamentos de Biometria Ocular utilizaram a técnica de imagem diagnóstica baseada na aplicação de ondas de ultrassom para medir o comprimento axial ocular, sendo denominados de Biometria Ultrassônica ou Ecobiometria.

A técnica de ultrassonografia consiste no uso de altas freqüências do som para se observar estruturas no interior do corpo. O som é propagado através de um cristal cerâmico chamado piezoelétrico.

A biometria ultrassônica mede o tempo que a onda ultrassônica leva para atravessar as estruturas do olho e o componente computadorizado do exame decodifica e converte este tempo em um valor linear, utilizando a fórmula de velocidade.

Existem dois tipos de procedimentos ultrassonográficos utilizados na oftalmologia: o modo-A unidimensional e o modo-B bidimensional, em tempo real. Recentemente, imagens tridimensionais vêm sendo usadas em exames ultrassonográficos, o que têm proporcionado mais precisão pré-operatória.

Os biômetros ultrassônicos liberam a energia ultrassônica através de um transdutor e, após uma pausa de microsegundos, os ecos que retornam são recebidos pelo transdutor e o biômetro converte em picos com diferentes amplitudes. Sendo assim, este tipo de biometria ultrassônica é denominada como A-Scan, pois realiza o escaneamento das amplitudes (A = Amplitude).

Neste exame, o som atravessa a córnea sólida, o humor aquoso líquido, o cristalino sólido, o humor vítreo líquido e os componentes sólidos da retina, coróide, esclera e tecido orbitário.

À medida que atravessa cada meio óptico, o ultrassom muda sua velocidade e os ecos, recebidos de volta pelo transdutor de cada uma destas interfaces, são convertidos, pelo biômetro, em picos relacionados à linha de base, apresentados na imagem do exame. A distância entre a córnea e o epitélio pigmentar da retina representa o comprimento axial ocular.

A biometria ultrassônica A-Scan pode utilizar a técnica de contato ou a técnica de imersão. Na biometria de contato, o probe ultrassônico é posicionado diretamente na córnea, enquanto na biometria de imersão, é utilizado uma concha escleral para que o transdutor não entre em contato diretamente com a córnea.

A acurácia da medida da biometria de contato e de imersão é similar, pois o exame de ultrassonografia é o mesmo, o que diferencia é apenas a variação dos resultados relacionados à técnica da medição.

Visto que a biometria de contato tem o efeito de compressão na córnea, que é examinador -dependente, as medidas obtidas pela técnica de contato podem apresentar maior variabilidade e menor precisão em relação à técnica de imersão.

Os resultados das medidas da biometria ultrassônica dependem da posição correta do exame no centro óptico para que a onda ultrassônica atinja o centro da fóvea. Se o transdutor do exame estiver fora do eixo óptico, pode medir, erroneamente, que o tamanho do olho é menor. Por outro lado, como o exame não é capaz de discriminar entre o centro da fóvea e a região periférica da fóvea, nos olhos altos míopes com grande estafiloma posterior (protrusão da esclera na miopia degenerativa), as medidas podem ser incorretas se o equipamento considerar a área mais posterior do estafiloma, em vez do centro da fóvea.

Os equipamentos de biometria ultrassônica são capazes de medir o comprimento axial, mas as medidas da ceratometria não são mensuradas por este equipamento, devendo-se informar estes dados antes de iniciar o exame. O exame fornece também a medida da Câmara Anterior, com os poderes dióptricos das lentes selecionadas para atingir o alvo desejado, que é a emetropia, na maioria dos casos.

Justamente para melhorar os resultados biométricos, os equipamentos de biometria ultrassônica mais diferenciados aplicam a técnica da biometria ultrassônica com os modos A/B.

Neste exame, o ultrassom com modo-B é usado para produzir uma imagem bidimensional, proporcionando a delimitação anatômica acurada do olho e da órbita, para permitir que o ultrassom no modo A alcance a retina, no centro da fóvea. Esta técnica é especialmente de grande utilidade para os altos míopes com estafiloma posterior.

Biometria Óptica

 Com o objetivo de obter medidas biométricas mais precisas, em 1999, surgiu o exame de biometria óptica, baseado no princípio de interferometria a laser de coerência parcial, com resolução muito mais precisa que a onda ultrassônica.

As medidas da biometria óptica não são dependentes do examinador, são isentas das variações relacionadas à compressão da córnea, pois a técnica é de não-contato e correspondem à posição ocular correta, no centro da fóvea.

Os exames de biometria óptica, além de medirem o comprimento axial ocular, também avaliam outras medidas anatômicas oculares, como descrito adiante.

Visto que o laser não é capaz de atravessar estruturas oculares muito densas, os exames de biometria não conseguem realizar medidas em olhos com cataratas muito maduras ou com cataratas com componente subcapsulares densos. Nestes casos, é necessário realizar a biometria ultrassônica para o cálculo da lente intraocular.

Biometria Óptica IOLMaster  

O exame de IOLMaster foi o primeiro modelo de biometria óptica, lançado desde 1999 e aprovado pelo FDA Americano (Food and Drug Adminstration), em março de 2000.

Visto que a acurácia do cálculo biométrico é diretamente relacionada à precisão da informação da constante da lente, que definirá a posição efetiva da lente no olho, foi criado um site do grupo de usuários da biometria por interferência a laser, denominado User Group for Laser Interference Biometry – ULIB website (http://ocusoft.de/ulib/).

Este site é alimentado com atualizações otimizadas das constantes de diversas lentes intraoculares, baseadas no feedback dos resultados obtidos com cada tipo de lente intraocular.

Atualmente, os modelos mais utilizados desta biometria óptica são o IOLMaster 500 e o IOLMaster 700.

 IOLMaster 500

O modelo da biometria IOLMaster 500 é baseado na técnica de não-contato, que utiliza o princípio de interferometria de baixa coerência óptica para obter medidas oculares do vértice da córnea até o epitélio pigmentar da retina, com precisão 5 vezes superior a biometria ultrassônica.

Além da medida do comprimento axial, o exame também mede a ceratometria, a profundidade da câmara anterior e a medida do branco-à-branco (opcional).

A ceratometria do IOLMaster é baseada na medida de 6 pontos na zona de 2,5 mm da córnea.

Como podemos ver no laudo do exame, o examinador pode escolher o alvo refrativo desejado para o pós-operatório e escolher as diversas fórmulas para os diversos tipos de lentes cadastradas no equipamento.

A versão IOLMaster 500 contém as fórmulas de 3ª geração – Hoffer Q, Holladay e SRK-T, as fórmulas de 4ª geração – Haigis e Holladay 2 e as fórmulas para olhos submetidos à Cirurgia Refrativa prévia – Haigis-L miópico e Haigis-L hipermetrópico.

IOLMaster 700

O modelo da biometria IOLMaster 700 é baseado na técnica de não-contato, que utiliza o princípio da interferometria de baixa coerência, com a tomografia de coerência óptica que utiliza um tipo de laser chamado “swept source” (Swept-Source OCT).

Neste equipamento são medidos além do comprimento axial, a ceratometria, a paquimetria corneal, o tamanho do branco-à-branco horizontal, a profundidade da câmara anterior (a distância da superfície corneal anterior até a superfície anterior da lente), a profundidade do humor aquoso (distância da superfície corneal posterior até a superfície anterior da lente) e a espessura do cristalino.

Segundo estudos clínicos atuais, a tecnologia do OCT permite que o IOLMaster 700 alcance uma taxa de penetração na catarata, superior a 99%. Além disso, essa tecnologia permite a visibilização das estruturas que estão sendo medidas (córnea, cristalino e fóvea), possibilitando a detecção de geometria ocular não-usual e inclinações do cristalino.

A versão IOLMaster 700 também contém as fórmulas de 3ª geração – Hoffer Q, Holladay e SRK-T, as fórmulas de 4ª geração – Haigis e Holladay 2 e as fórmulas para olhos submetidos à Cirurgia Refrativa prévia – Haigis-L miópico e Haigis-L hipermetrópico. Na Suíte Barret  disponibiliza as novas fórmulas Barret (Barret Universal II, Barret True-K e Barret Toric) e a na Suíte Haigis, a nova fórmula Haigis-T para o cálculo da lente tórica.

 Biometria Óptica LENSTAR

A biometria LENSTAR é baseada na técnica de não-contato, que utiliza o princípio de reflectometria de baixa coerência óptica para obter medidas oculares precisas, tendo sido lançada em 2009.

Além da medida do comprimento axial, é capaz de mensurar a ceratometria, a paquimetria, o tamanho do branco-à-branco, a medida do tamanho da pupila, a profundidade da câmara anterior (da superfície anterior da córnea à superfície anterior do cristalino), a profundidade do humor aquoso (da superfície anterior da córnea à superfície anterior do cristalino), a espessura do cristalino, a excentricidade do eixo visual e a espessura da retina.

A medida da ceratometria do LENSTAR utiliza 32 pontos, situados nas zonas de 1,65 mm e 2,35 mm da córnea, combinando as medidas destas duas zonas.

A versão mais atualizada da Biometria Óptica LENSTAR disponibiliza as fórmulas de 3ª geração – Hoffer Q, Holladay e SRK-T, as fórmulas de 4ª geração – Haigis e Holladay 2 e as fórmulas mais modernas – Barret Universal II, Olsen e Hill-RBF.

Também apresenta as fórmulas para olhos submetidos à Cirurgia Refrativa prévia, com ou sem a história clínica prévia: Shammas No-History, Barret True-K, Masket e Masket modificada.

Como ítens opcionais, disponibiliza a Calculadora Barret Tórica e a plataforma T-Cone Tórica, que permite que o Lenstar realize a Topografia do Disco de Plácido na zona de 6 mm da córnea e que o planejamento da lente tórica seja realizado com maior precisão.

Os biômetros IOLMaster 700 e Lenstar atualmente podem ser acoplados via interface de software adicional com Programas de Cálculos de Lentes Intraoculares.

Dentre estes programas, podemos citar o Holladay IOL Consultant Professional, desenvolvido pelo Dr. Holladay, o Phaco  Optics, desenvolvido pelo Dr. Olsen e o Okulix, desenvolvido pelo Dr. Preussner.

Os programas Phaco Optics e Okulix utilizam o método de rastreamento dos raios para o cálculo da lente intraocular, de acordo com as informações oriundas da interface deste programa, especialmente com, os Tomógrafos Pentacam e Galilei e os biômetros.

Pentacam AXL

O Pentacam AXL combina o princípio da tomografia de Scheimpflug para análise tridimensional do segmento anterior com o da interferometria de coerência parcial para a medida do comprimento axial e, por isso, é caracterizado como Tomógrafo de Segmento Anterior e Biômetro Óptico.

O Pentacam AXL realiza medidas seqüenciais do comprimento axial e o programa seleciona a melhor medida para obter a imagem tridimensional do segmento anterior, descrita em detalhes na Sessão Exames – Cirurgia de Catarata – Exames da Córnea.

O Pentacam AXL inclui as fórmulas tradicionais para olhos normais Hoffer-Q, Holladay I, SRK-T e Haigis, as fórmulas para olhos submetidos à Cirurgia Refrativa prévia, Potvin-Shammas-Hill (miopia com excimer laser) e Potvin-Hill (ceratotomia radial), fórmulas com Duplo-K (Hoffer Q Double-K, Holladay I Double-K e SRK-T Double-K). Oferece também fórmula para lente tórica da análise meridional baseada no Poder Refrativo Corneal Total (TCRP) e como itens opcionais, as fórmulas baseadas no rastreamento dos raios (Phaco Optics e OKULIX).